Um agente soviético com “jitters” coloca em movimento um intrincado jogo de espionagem, sexo, quebra de códigos e assassinato.

O simpático e agradecido Vasili deixa escapar a Nina um segredo de estado e lhe conta que um de seus velhos agentes está sofrendo de “jitters” e adorei o modo como ele se chacoalhou todo para explicar o significado da palavra, de difícil tradução. Seria assim algo uma mistura de calafrios, nervosismo e pessimismo. Só não foi engraçada a maneira como Nina fez com que Vasili baixasse a guarda e lhe confidenciasse o que não devia.


Quando James Bond vai para a cama com uma mulher, é tudo glamouroso, maneira perfeita de realizar uma fantasia sexual e servir a Pátria. Mas os filmes de Bond não passam de tola fantasia. Como o episódio COMINT (de Communication Intel) mostra, o sexo é a moeda de troca, o óleo que lubrifica as engrenagens do sistema de inteligência. Coloca os alvos à vontade e dispostos a falar o que não devem desde que a pessoa manipulando a outra sexualmente esteja disposta a pendurar qualquer objeção moral no cabide junto com suas roupas.

Nesse episódio vimos alguns exemplos bem interessantes de como os espiões lidam (ou pelo lidavam, lá pelos distantes, mas nem tanto, idos de 1981) com o jogo da espionagem. Beeman revela a Nina que seus colegas e superiores, cujo “amor pela liberdade é tão intenso”, exigem resultados cada vez mais importantes e frequentes. E que Nina é uma mulher linda, inteligente, intuitiva, linda (sim, ele falou mais de uma vez, o que desperta um leve sorriso na envaidecida Nina) que saberia exatamente como obter a informação. E então se diz chocado quando ela afirma ter feito “o que ele mandou”.


Pior é que Beeman até parece acreditar nisso. Ele percorre uma linha tênue entre um desajeitado homem casado diante de uma mulher linda (sim, já estabelecemos esse fato) e um agente que espera obter resultados sem se importar com o meio necessário. Por uma fração de segundo ele pareceu estar soltando galanteios como um colegial impressionado, mas Nina entendeu o recado muito bem. E quando Beeman ficou lhe falando como ela deve escolher um novo nome, que ela será resgatada, que poderá dormir tranquila, sinto que ele acredita mesmo nisso, mas é óbvio que o governo americano não tem interesse nenhum de que ela deserte, pois é valiosa onde está. E uma mudança só será provocada quando os soviéticos a desmascararem, o que resultará, então, numa extração às pressas, na morte rápida de Nina (mais provável, mas ingenuamente torcemos contra isso) ou numa seção de tortura na Sibéria (o pior dos cenários possíveis).


Os Jennings também se defrontam com a questão do sexo como facilitador de seu trabalho. Elizabeth é capaz de se transformar, parecendo uma titia comportada para o antiquado agente viúvo, e uma moça “safada” que até gosta de levar algumas palmadinhas dadas pelo empresário sádico que fornece a nova tecnologia ao FBI. E ainda tem a presença de espírito de fingir choro e desespero para controlá-lo quando as taras dele fogem de controle. Notem como ela chora e “implora” para ele parar de machucá-la, para, em seguida, mostrar toda sua frieza siberiana em sua expressão de relativa satisfação.


E o outro caso em que um Jennings lidou com o sexo mostrou como é possível, até certo ponto, a pessoa se preservar e evitar ultrapassar certos limites morais. Ao manipular a secretária do FBI cujo fetiche por sapatos despertou o interesse do pobre agente Amador, Phil (fingindo ser Clark) deu-lhe um beijinho, confessou uma espécie de paixonite contida, mas que “infelizmente” limites não podem ser rompidos, tudo pelo senso de dever. A maneira como Phil tenta preservar sua vida pessoal de homem casado, ao mesmo tempo em que tem ataques de ciúmes como todo bom marido deve ter, mostra a profunda diferença psicológica entre Philip e Elizabeth. Ela, que surpreende o marido ao confessar que sempre dorme preocupada com coisas maiores do que ela.

Pois é, tudo isso, novamente, acontece graças ao fato do FBI ter desenvolvido um novo sistema de criptografia ao mesmo tempo em que vigiam os soviéticos de perto, impedindo Vasili de entrar em contato com Udacha, seu agente que está, como diríamos, entrando em parafuso. Mas, é claro, o agente Udacha é supostamente importante demais para ser deixado de lado e isso coloca os Jennings em ação mostrando a mecânica, por assim dizer, do jogo de espionagem.


A cena em que Elizabeth se esconde transfere de um porta-malas para outro e “hackeia” o sistema “computadorizado” soviético (cabe lembrar que antigamente os computadores usavam cartões perfurados como programação) foi emocionante e quase nos mata de susto quando o carro do FBI vai embora sem dar tempo a Elizabeth de sair.


Ironicamente o desfecho com o agente “importante demais” para ser ignorado ou perdido foi, justamente, o que mostra que ninguém é importante ou indispensável demais. A recompensa por seus longos anos de serviço foi um uma bala entre os olhos. E o tiro, previsivelmente, dado por ninguém menos que Elizabeth, novamente disposta a fazer qualquer coisa.


E segue-se o autêntico efeito dominó. Os soviéticos obtêm o código usado pelo FBI, Vasili conta a Nina, Nina conta a Beeman. O FBI troca os códigos no mesmo dia, os soviéticos ficam sabendo e constatam: tem alguém infiltrado. E eu diria que os dias de Nina estão contados, pois é só uma questão de tempo que a KGB chegue a ela.


E ao final de um dia de trabalho, foi interessante ver como os vizinhos, os Beemans e os Jennings lidam com a situação. A esposa de Stan aparece com um négligé provocante e memórias de tempos felizes, mas Stan quer mesmo é aprender russo em nome do dever, com o benefício extra de poder dizer a Nina que ela é bonita na língua dela. E, por outro lado, vemos como Phil, após descobrir que os soviéticos têm um inimigo infiltrado, prefere resguardar sua mulher para que ela tenha, pelo menos, uma boa noite de sono relativamente sem preocupação. E dormem abraçadinhos.



Notas adicionais:

- Vários disfarces nesse episódio. Os Jennings devem ter um depósito cheio de perucas e roupas diferentes.


- Os atores Matthew Rhys e Noah Emmerich estão fazendo um ótimo trabalho juntos. A “amizade” de seus personagens parece tão real quanto uma nota de sete rublos, mesmo com tantas partidas de racquetball. É o que diz a (pelo que me consta) Machiavelli: “Mantenha seus amigos perto, e seus inimigos mais ainda.”

- Filosofia de uma mulher russa durona: “O que as americanas têm que entender é aquilo que nós sempre soubemos. Você não pode esperar que a lei lhe dê seus direitos. Tem que tomá-lo, reclamá-los a cada segundo de cada dia de cada ano.” E qual será a filosofia da brasileira?


- Os personagens secundários estão se revelando. (Do lado russo, nem considero mais Nina e Claudia como secundárias.) Além de Vasili, com cada vez mais espaço na trama, temos Arkady. Ele parece que vai tornar a vida de Nina um inferno.


- Pelo lado do FBI, o agente Gaad dá um show de segurança e liderança. Suas poucas cenas são sempre marcantes.


- E Amador, ah, pobre Amador. Dessa vez leva um fora da mulher desejada e Gaad se vê obrigado a fingir que concorda que o comentário gentil que ele fez foi sexista. Amador realmente é o saco de pancada do escritório. Juro que, quando ele estava olhando pelo binóculo, imaginei a cena desse jeito:


- Closes particularmente interessantes da ala feminina do show, só porque deu vontade.



Comemorando a renovação

Como falei na coluna anterior, The Americans já foi renovado para uma segunda temporada. Vamos comemorar com o exército vermelho! Para isso, tem aqui um vídeo com uma dancinha. Os passos são bem simples e fáceis de aprender.


Casatchok, tradicional dança russa



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